Lei das Cripto: O inédito marco regulatório brasileiro e seus principais impactos

Pinheiro Pedro Advogados • 28 de março de 2023

Rodrigo Vieira das Neves de Arruda


Com o fim do período de “vacatio legis”, isto é, do período entre a data da publicação de uma lei e o início de sua vigência, o chamada Lei dos Criptoativos passa a valer no Brasil, colocando uma luz em dos pontos mais obscuros e de difícil controle hodiernamente.

Historicamente, as operações que envolvem criptoativos (exceto os fundos) não dependem da supervisão de um banco ou qualquer outra instituição financeira. Por isso, elas são conhecidas como aplicações descentralizadas, levando a ausência quase total de controle e fiscalização, o que tornou esse mercado muito atrativo para quem não quer deixar rastros de suas operações econômicas, variando desde empresários que buscam discrição e blindagem de concorrentes, chegando ao extremo do uso por organizações criminosas para lavar dinheiro.

Líder no mercado latino-americano de criptomoedas, o Brasil ficou em sétimo lugar no ranking global de adoção de moedas virtuais em 2022, da empresa de análise em blockchain Chainanalisys. Em relação à penúltima edição do levantamento, de 2021, o país cresceu sete posições e ficou à frente de mercados como a China e a Inglaterra.

Segundo estimativa da empresa de criptomoedas “TripleA”, em 2021, o Brasil detinha 5% da população com criptoativos – o equivalente a cerca de 10,4 milhões de pessoas. Estima-se que o valor total de transações com ativos digitais chegou a R$ 317 bilhões em 2021 – seis vezes o valor de 2020.

Conforme o diretor-presidente da Associação Brasileira de Criptoeconomia (Abcripto), Bernardo Srur, o Brasil assume a dianteira em termos de regulamentação do mercado de criptomoedas, o que dá segurança jurídica para as operações e atrai mais investidores.

Segundo ele, à exceção de Dubai, outros mercados desenvolvidos como os Estados Unidos, União Europeia e Reino Unido ainda não têm leis amplas para tratar da questão.

O diretor jurídico da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Vicente de Chiara, em entrevista ao portal Jota, disse que o novo marco legal é muito bem-vindo, sobretudo, porque não regulou o ativo digital, mas a atividade das corretoras. “A lei removerá a assimetria regulatória entre as exchanges e as instituições bancárias, que também passaram a trabalhar com criptoativos e que já contam com forte regulamentação de suas atividades”, destaca.

Além disso, é notório que a nova lei protegerá, em especial, o investidor que não é especialista em ativos digitais já que continuará havendo os investidores independentes, que compram e vendem de forma isolada, sem intermediários.

Mesmo considerada um avanço, a lei – aprovada depois de sete anos de discussões – se omite sobre aspectos como a competência de órgãos sobre a gestão do sistema de ativos digitais, sendo esperado que haja uma atribuição conjunta entre o Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Outro ponto omisso no Marco Legal das Criptomoedas é a segregação patrimonial, prática que mantém o dinheiro dos clientes separado dos ativos corporativos das corretoras. A questão chegou a ser incorporada pelo Senado Federal no texto do Projeto de Lei nº 4401/2021, de autoria do deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ), que deu origem à nova lei. No entanto, acabou sendo retirada na aprovação pela Câmara dos Deputados, antes de seguir para sanção presidencial.

Outro ponto removido do PL 4401/2021, mas de forma pacificada, foi a obrigatoriedade de as corretoras terem Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no Brasil. O entendimento foi o de que a lei só pode ser aplicada em território nacional e, por isso, não há necessidade de esse ponto ser expresso no texto.

Entre os avanços trazidos pela nova lei está a regulamentação de crimes praticados com as criptomoedas, entre os quais estão o estelionato e a lavagem de dinheiro. A lei insere novos tipos penais em leis já existentes – como o Código Penal e a Lei de Lavagem de Dinheiro –, com aumento de pena caso crimes sejam praticados por meio dos criptoativos.

Nesse ponto, embora a tipificação de crimes envolvendo criptoativos possa ser celebrada, com o desenvolvimento do mercado e diante da complexidade e sofisticação tecnológicas que envolvem as cripto, os fenômenos serão estudados de forma mais apurada e consequentemente exigirá a construção de tipos penais com uma redação cada vez mais técnica.

Outro ponto da nova legislação, que precisará de adaptações futuras principalmente com o avanço das chamadas “Govcoins”, isto é, as criptomoedas oficiais, é a equiparação das corretoras com instituições financeiras para fins de aplicação da Lei 7.492/86, sobre crimes contra o sistema financeiro.

Hoje, existem basicamente três cenários no que se refere à adoção de criptomoedas no mundo. No primeiro, adotado em países como El Salvador, comerciantes são obrigados a aceitar a moeda virtual. O segundo modelo, de países como o Brasil, os vendedores podem aceitar, mas não são obrigados. Além disso, em nove mercados, incluindo o chinês, os criptoativos são completamente proibidos.

Segundo estudo da consultoria LCA, encomendado pela Abcripto, devido à incipiência da criptoeconomia e do uso recente tecnologia blockchain – conjunto de blocos em cadeia, contendo dados e informações, para registro de transações e controle de ativos – existem desafios para o desenvolvimento de boas práticas regulatórias para o setor. Isso permite que a legislação brasileira se aproveite de diferentes aspectos das normas de diferentes jurisdições. Entre as que mais têm inspirado o modelo brasileiro estão as dos Estados Unidos e da União Europeia.

Nos Estados Unidos, a criptoeconomia já integra o sistema financeiro e as exchanges precisam informar o órgão de Receita sobre as operações com criptoativos.

A União Europeia caminha para o estabelecimento de normas gerais. No entanto, atualmente as exchanges são reguladas por diretrizes de cada Estado-membro e precisam atender a regras de compliance das autoridades financeiras europeias.

Organismos multilaterais sinalizam ainda a urgência de se estabelecer normas internacionais para regulação e tributação de criptoativos. Em abril de 2022, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) publicou o padrão internacional para declaração de operações com criptoativos, denominado Crypto-Asset Reporting Framework.

No Brasil, antes da entrada em vigor do marco regulatório atual, já havia a obrigatoriedade, desde 2019, de se informar à Receita Federal sobre as operações realizadas com criptoativos.

A legislação ainda explicita que a entidade ou órgão regulador será definido em ato do Poder Executivo, tendo dentre algumas de suas atribuições: Autorizar o funcionamento e a transferência de controle das corretoras; supervisionar o funcionamento delas; Cancelar, de ofício ou a pedido, as autorizações; Fixar as hipóteses em que as atividades serão incluídas no mercado de câmbio ou deverão se submeter à regulamentação de capitais brasileiros no exterior e capitais estrangeiros no País.

Ademais, caberá ao órgão regulador estabelecer as condições e prazos, não inferiores a seis meses, para a adequação às novas regras por parte das prestadoras de serviços de ativos virtuais (corretoras de criptoativos). Estas poderão prestar exclusivamente o serviço de ativos virtuais ou acumulá-lo com outras atividades, na forma da regulamentação a ser editada.

Por fim, vale lembrar que a legislação exclui de sua aplicação os ativos representativos de valores mobiliários. As ofertas de tokens em andamento nas principais exchanges serão analisadas pela CVM e a mesma irá avaliar o enquadramento das ofertas como Contrato de Investimento Coletivo (CIC), em sendo afirmativo, a operação entra no perímetro de ação da autarquia.


Por Pinheiro Pedro Advogados 15 de janeiro de 2025
O Direito Público e Administrativo desempenha um papel central na regulamentação das relações entre cidadãos, empresas e a administração pública. Esse ramo do direito é essencial para garantir que todas as interações com órgãos governamentais ocorram dentro da legalidade, promovendo transparência, eficiência e segurança jurídica. No escritório Pinheiro Pedro, contamos com uma equipe especializada e com ampla experiência para atender às demandas desse segmento, proporcionando soluções personalizadas e eficazes para nossos clientes. O que o Direito Público e Administrativo abrange? Nossa atuação nessa área contempla: · Contratos Administrativos: Elaboração, revisão e acompanhamento de contratos firmados com órgãos públicos, assegurando o cumprimento de normas e cláusulas específicas. · Licitações : Assessoria completa para participação em processos licitatórios, desde a análise de editais até a impugnação de irregularidades. · Defesa em Processos Administrativos: Representação em processos junto a órgãos reguladores e outras entidades públicas. · Parcerias Público-Privadas (PPPs) e Concessões: Consultoria em projetos de infraestrutura, concessões e parcerias público-privadas, oferecendo suporte jurídico estratégico. · Compliance e Políticas Públicas: Implementação e adequação às normas regulatórias, contribuindo para a transparência e governança corporativa. Por que investir em uma boa assessoria jurídica nesta área? O Direito Público e Administrativo é complexo e dinâmico, exigindo um conhecimento aprofundado das leis, regulamentos e práticas que regem a administração pública de cada ente estatal. Contar com uma assessoria jurídica especializada é indispensável para: · Evitar sanções e penalidades por descumprimento de normas. · Garantir a conformidade em contratos e processos administrativos. · Minimizar riscos em negociações e parcerias com o setor público. · Solucionar conflitos de forma ágil e eficiente. Seja para empresas privadas, organizações do terceiro setor ou agentes individuais, a atuação nessa área é estratégica para proteger interesses e alcançar resultados sustentáveis. Por que escolher o Pinheiro Pedro para sua assessoria em Direito Público e Administrativo? Com uma equipe altamente qualificada e anos de experiência, o escritório Pinheiro Pedro se destaca por sua abordagem personalizada e comprometimento com a excelência. Nosso objetivo é oferecer suporte jurídico completo e estratégico, desde a consultoria preventiva até a defesa em litígios complexos, sempre com foco em atender às necessidades específicas de nossos clientes.
Por Pinheiro Pedro Advogados 18 de dezembro de 2024
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), conhecido como imposto sobre heranças, não deve ser aplicado a valores recebidos por beneficiários de planos de previdência privada aberta, nas modalidades VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) e PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre). A decisão, tomada por unanimidade na última sexta-feira (13), seguiu o entendimento do relator, ministro Dias Toffoli, que destacou que esses valores são recebidos devido a uma relação contratual e não por herança. O ministro ressaltou que “isso, contudo, não impede que o Fisco possa questionar eventuais estratégias abusivas de planejamento fiscal que simulem a ocorrência de um fato gerador do imposto.” Os planos VGBL e PGBL funcionam de forma semelhante a seguros, garantindo que os recursos aplicados sejam destinados aos beneficiários em caso de falecimento do titular, com diferenças no tratamento do Imposto de Renda. Essa decisão, com repercussão geral, abrange 114 processos que tratam do tema e decorre de um Recurso Extraordinário envolvendo a Feneaseg e o Estado do Rio de Janeiro contra dispositivos da Lei estadual 7.174/15. A tese aprovada pelo STF definiu que: "É inconstitucional a cobrança do ITCMD sobre valores repassados a beneficiários de planos VGBL e PGBL em caso de falecimento do titular."
Por Pinheiro Pedro Advogados 26 de setembro de 2024
No dia 20 de setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu um julgamento de repercussão geral que estabelece novos critérios para o fornecimento de medicamentos não incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A decisão, que busca padronizar o entendimento sobre o tema, foi recebida com apreensão por especialistas e pacientes, principalmente em razão dos obstáculos criados para o acesso a tratamentos de alto custo e inovadores, em especial aqueles voltados para doenças raras. A tese, apresentada pelos ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, define que o fornecimento de medicamentos não listados no SUS só será permitido em situações excepcionais. Entre os critérios exigidos estão a necessidade de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a comprovação de que o tratamento é eficaz, seguro e insubstituível para o paciente. Além disso, a decisão determina que os juízes consultem órgãos técnicos, como o NatJus (Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário), antes de conceder qualquer liminar. No entanto, um dos pontos mais criticados pela comunidade médica e por entidades que representam pacientes é a exigência de que o processo de incorporação do medicamento ao SUS seja submetido à análise da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). Para muitos, essa exigência representa um entrave burocrático significativo, especialmente considerando a lentidão da Conitec para avaliar novos tratamentos. Segundo Toni Daher, presidente da Federação Brasileira das Associações de Pacientes com Doenças Raras (Febrararas), essa condição pode discriminar pacientes que necessitam de medicamentos de alto custo, deixando-os sem alternativas terapêuticas imediatas. Impacto na saúde pública e na vida dos pacientes O fornecimento de medicamentos fora das listas do SUS já é um dos temas mais polêmicos do Judiciário brasileiro, com forte impacto nas finanças públicas e um volume crescente de judicializações. Muitos dos tratamentos judicializados são para doenças raras e crônicas, com preços que podem chegar a milhões de reais por paciente, como o Zolgensma, utilizado para tratar atrofia muscular espinhal (AME), considerado o medicamento mais caro do mundo. Embora tenha sido incorporado ao SUS em 2022, o Zolgensma ainda não está disponível aos pacientes por questões burocráticas, o que exemplifica as preocupações de especialistas. O presidente da Febrararas também aponta que a Conitec muitas vezes demora anos para aprovar a incorporação de medicamentos, deixando pacientes sem acesso a tratamentos inovadores e eficazes. Além disso, ele critica o fato de que a maioria das decisões da Conitec não levam em consideração os relatos e a realidade dos pacientes. A comissão, vinculada ao Ministério da Saúde, se baseia em análises de custo-efetividade, mas, segundo Daher, a falta de especialistas em doenças raras no processo prejudica a compreensão adequada das necessidades dos pacientes. Outro ponto de crítica é a falta de clareza sobre como os pacientes podem comprovar ilegalidade nas decisões da Conitec, uma vez que essas avaliações são altamente técnicas e colocam os pacientes em uma situação desvantajosa. Judicialização e a busca por alternativas Com a nova tese do STF, os processos envolvendo medicamentos de alto custo deverão tramitar na Justiça Federal quando o valor anual do tratamento for superior a 210 salários mínimos. Essa mudança pode dificultar ainda mais o acesso à Justiça para pacientes vulneráveis, que dependem da atuação das Defensorias Públicas Estaduais. Segundo Henderson Fürst, presidente da Comissão de Bioética da OAB-SP, a Defensoria Pública da União (DPU), responsável por essas causas, está presente em menos de 30% dos municípios brasileiros, o que pode gerar desassistência em diversas regiões do país. Outro desafio enfrentado pelos pacientes é o descumprimento de ordens judiciais por parte do SUS. Mesmo quando conseguem decisões favoráveis, muitos pacientes relatam atrasos no fornecimento dos medicamentos, obrigando seus advogados a recorrerem a medidas adicionais, como o bloqueio de verbas públicas, para garantir o cumprimento das sentenças. Sustentabilidade do SUS versus direito à saúde A decisão também dificulta o acesso a medicamentos de uso "off label", aqueles que, embora não tenham sido originalmente aprovados para determinada condição, apresentam resultados promissores em estudos clínicos. A burocracia para a incorporação de novos medicamentos ao SUS e à Anvisa é vista como um dos principais obstáculos para pacientes que dependem de tratamentos inovadores. Apesar de a tese do STF ter sido considerada por alguns como um avanço na organização do sistema, é evidente que os pacientes, especialmente os portadores de doenças raras, enfrentarão maiores dificuldades para acessar tratamentos essenciais. Para especialistas e defensores dos pacientes, a criação de varas específicas de saúde e a maior independência da Conitec seriam passos importantes para garantir que as necessidades de saúde da população sejam atendidas de forma justa e eficiente.
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